sábado, 22 de novembro de 2008

Capricho e Soberba

Baptista-Bastos
Escritor e jornalista b.bastos@netcabo.pt



"Cento e vinte mil mil professores na rua não emocionaram o Governo. A ministra e Sócrates afirmaram-se renitentes nas decisões tomadas: é assim que dissemos, é assim que fazemos. Capricho, desdém e alarde não constituem excepção neste Executivo, o qual, sem ser, notoriamente, socialista, também não é carne nem peixe nem arenque vermelho. Mas 120 mil pessoas indignadas não são a demonstração de uma birra absurda nem a representação inútil de uma frivolidade. A cega teimosia de Sócrates pode, talvez, explicar que não está à altura do seu malogro, mas sim do seu umbigo. Porque de malogro e de narcisismo se trata. A qualidade de um Governo afere-se pelo grau de comunicabilidade que estabelece com os outros, e pelo sentido ascensional que possui do tempo e do espaço para elevar a vida colectiva. Sócrates esqueceu-se, ou ignora, que o homem é ele e a sua circunstância, como ensinou Ortega. E que num político a circunstância é criada por ele próprio, sem negligenciar os outros. A verdade é que não conhecemos os seus desígnios criativos, mas sim as variações desafortunadas da sua política. Há tempos, João Lopes, o amigo e o crítico por igual excelente, dizia-me que Portugal tinha falta de compaixão. A palavra "compaixão" adquiria o sentido de simpatia e compreensão pelo outro. É verdade. Ausentamo-nos e negamo-nos, escarnecemo-nos e desprezamo-nos, deixámos de nos ouvir uns aos outros; nem transeuntes somos: trespassamo-nos porque dissipámos a consistência e, acaso, a ternura. Com a nossa desmedida indiferença permitimos o nascimento de gente presumidamente detentora da verdade. A soberba de Sócrates, ante o protesto dos 120 mil, advém, certamente, desse sombrio e feio convencimento. Em Fevereiro de 1947, quando, em França, se preparavam eleições, Camus escreveu, no Combat, um texto que assim começava: "Os problemas que há dois anos nos excedem vão cair no mesmo impasse. E, sempre que uma voz livre procurar afirmar, sem pretensões, aquilo que pensa, logo uma matilha de cães de guarda, de todas as cores e feitios, começará a ladrar furiosamente, para abafar o eco dessa voz." Em consciência, a impassibilidade de José Sócrates e a crispada frieza de Maria de Lurdes Rodrigues podem abafar o eco de 120 mil vozes, que protestam muitas razões de que não é preciso reter senão as mais importantes? Um Governo que recusa, constantemente, a obrigação de ouvir o outro, admite a possibilidade do direito à desobediência. A rigidez decisória não conduz ao apaziguamento e distancia-se dos verdadeiros interesses, criando rancores e ressentimentos desnecessários e duradouros. Conversar, escutar, dialogar, debater, por vezes com furor e impaciência, é solução muito mais eficaz do que alimentar uma inconsiderada teimosia, de consequências imprevisíveis." in DN opinião

terça-feira, 11 de novembro de 2008

8 de Novembro - A nossa manifestação em Lisboa

Educação - texto de Manuel Alegre

Nº 002 . NOVEMBRO 2008
EDUCAÇÃO, DO BÁSICO AO SUPERIOR


Editorial


Manuel Alegre

"O lançamento do número 2 da revista ops!, dedicado à educação, ocorre depois de factos que não podem deixar de ser salientados: a eleição de Obama, que foi uma reafirmação da vitalidade da democracia americana, e que constitui em si mesma uma grande esperança para os Estados Unidos e o mundo; a manifestação que reuniu em Lisboa mais de cem mil professores em protesto contra o sistema de avaliação imposto pelo ministério; o alerta de 15 antigos reitores em carta enviado ao Presidente da República e ao Primeiro Ministro na qual alertam para o risco de ruptura financeira nas Universidades. E a resposta do ministro do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES), de que nas universidades há maus gestores.

Se a eleição de Obama é um facto de mudança, devemos ter consciência de que, num país como o nosso, o que faz mudar é a formação das pessoas, a educação, a cultura, a comunicação, a produção e divulgação científica, a inovação tecnológica e social. Tal não é viável num clima de tensão permanente entre o Ministério da Educação e os Professores, nem num ambiente de incompreensão entre o MCTES e as universidades.

Confesso que me chocou profundamente a inflexibilidade da Ministra e o modo como se referiu à manifestação, por ela considerada como forma de intimidação ou chantagem, numa linguagem imprópria de um titular da pasta da educação e incompatível com uma cultura democrática.

Confesso ainda que, tendo nascido em 1936 e tendo passado a vida lutar pela liberdade de expressão e contra o medo, estou farto de pulsões e tiques autoritários, assim como de aqueles que não têm dúvidas, nunca se enganam, e pensam que podem tudo contra todos.

O Governo redefiniu a reforma da educação como uma prioridade estratégica. Mas como reformar a educação, sem ou contra os professores? Em meu entender, não é possível passar do laxismo anterior a um excesso de burocracia conjugada com facilitismo. Governar para as estatísticas não é reformar. A falta da exigência da Escola Pública põe em causa a igualdade de oportunidades. Por outro lado, tudo se discute menos o essencial: os programas e os conteúdos do ensino. A Escola Pública e as Universidades têm de formar cidadãos e não apenas quadros para as necessidades empresariais. No momento em que começa a assistir-se no mundo a uma mudança de paradigma, esta é a questão essencial. É preciso apostar na qualificação como um recurso estratégico na economia do conhecimento, através da aquisição de níveis de preparação e competências alargados e diversificados. Não é possível avançar na democratização e na qualificação do sistema escolar se não se valorizar a Escola Pública, o enraizamento local de cada escola, a participação de todos os interessados na sua administração, a autonomia e responsabilidade de cada escola na aplicação do currículo nacional, a educação dos adultos, a autonomia das universidades e politécnicos.

Não aceito a tentativa de secundarizar e diminuir o papel do Estado no desenvolvimento educacional do nosso país. Sou a favor da gestão democrática das escolas, com participação dos professores, dos estudantes, dos pais, das autarquias. Defendo um forte financiamento público e um razoável valor de propinas, no ensino superior, acompanhado de apoio social correctivo sempre que necessário. E sou a favor do aumento da escolaridade obrigatória para doze anos. Devem ser criadas condições universais de acesso à escolaridade obrigatória, nomeadamente através de transporte público gratuito e fornecimento de alimentação. O abandono escolar precoce deve ser combatido nas suas causas sociais, culturais e materiais.

Não se pode reformar a educação tapando os ouvidos aos protestos e às críticas. É preciso saber ouvir e dialogar. É preciso perceber que, mesmo que se tenha uma parte da razão, não é possível ter a razão toda contra tudo e contra todos. Tal não é possível em Democracia."

Get involved - What I want for my children

This video was produced by Heidi Hass Gable.
"My hope is that it will move you, it will motivate you,
it will make you think and it will inspire you to get involved in your child’s education,to support your teachers and to be part of creating great schools!" (Heidi)

sábado, 27 de setembro de 2008

Esta profissão que escolhi - Professora

Se nos deixassem falar, nós diríamos o que nos vai na alma "Deixem-nos exercer a nossa profissão com dignidade. Nós queremos, realmente, ensinar, contribuir para o crescimento cultural, cívico e moral dos nossos alunos. Estratégias mais modernas ou mais antigas, maior ou menor recurso às tecnologias, mais ou menos formação - todos nos preocupamos e fazemos o nosso melhor para que o conhecimento chegue aos jovens! A imagem que os políticos construiram dos professores não corresponde à verdade! Nós não somos incompetentes! Nós gostamos de ensinar (ainda!), de ver os nossos alunos crescer, de os ver entrar nas faculdades ou arranjar o primeiro emprego. Nós gostamos de olhar para eles e ver o resultado do nosso esforço! Nós gostamos de os ver cidadãos bem formados, empenhados e participativos. Engenheiros ou técnicos, empresárias ou secretárias, nós queremos vê-los trabalhadores felizes e capazes!
Nós somos uma classe de respeito como todas as outras, e queremos ser tratados como tal. Nós não somos culpados dos males da sociedade! Nós queremos construir uma sociedade melhor! Não é isso que está implicito nesta profissão?

Texto de Daniel Oliveira, no expresso

"RANKINGS E XANAX

Esta semana evite a companhia de professores. Falar com qualquer um deles pode deixá-lo em mau estado. Vivem, nos dias que correm, em depressão colectiva. A sucessão de reformas, contra-reformas e contra-contra-reformas, a destruição do que se foi fazendo de bom - do ensino especial ao ensino artístico -, a incompetência desta equipa ministerial e o linchamento público de uma classe inteira tem os resultados à vista: as aulas recomeçam com professores tão motivados como um vegetariano perante um bife na pedra.

Sabem que os espera apenas uma novidade: a avaliação do seu desempenho. E é, ao que parece, tudo o que interessa a toda a gente: a avaliação dos professores, a avaliação dos alunos, a avaliação das escolas, a avaliação do sistema educativo português.

Tenho uma coisa um pouco fora do comum para dizer sobre o assunto: a escola serve para ensinar e aprender. Se isto falha, os exames, as avaliações e os "rankings" são irrelevantes. Talvez não fosse má ideia, enquanto se avaliam os professores, dar-lhes tempo para eles fazerem aquilo para que lhes pagamos em vez de os soterrar em burocracia. Enquanto se exigem mais e mais exames, garantir que os miúdos aprendem com algum gosto qualquer coisa entre cada um deles.

Enquanto se fazem "rankings", conseguir que a escola seja um lugar de onde não se quer fugir. E enquanto se culpam os professores pelo atraso cultural do país, perder um segundo a ouvir o que eles têm para dizer. Agora que já os deixámos agarrados ao Xanax, acham que é possível gastar algumas energias a dar-lhes razões para gostarem do que fazem? Se não for por melhor razão, só para desanuviar o ambiente nos edifícios onde os nossos filhos passam uma boa parte do dia."
"RANKINGS E XANAX

Texto de Daniel Oliveira, no Expresso.

Esta semana evite a companhia de professores. Falar com qualquer um
deles pode deixá-lo em mau estado. Vivem, nos dias que correm, em
depressão colectiva. A sucessão de reformas, contra-reformas e
contra-contra-reformas, a destruição do que se foi fazendo de bom - do
ensino especial ao ensino artístico -, a incompetência desta equipa
ministerial e o linchamento público de uma classe inteira tem os
resultados à vista: as aulas recomeçam com professores tão motivados
como um vegetariano perante um bife na pedra.

Sabem que os espera apenas uma novidade: a avaliação do seu
desempenho. E é, ao que parece, tudo o que interessa a toda a gente: a
avaliação dos professores, a avaliação dos alunos, a avaliação das
> escolas, a avaliação do sistema educativo português.
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> Tenho uma coisa um pouco fora do comum para dizer sobre o assunto: a
> escola serve para ensinar e aprender. Se isto falha, os exames, as
> avaliações e os "rankings" são irrelevantes. Talvez não fosse má
> ideia, enquanto se avaliam os professores, dar-lhes tempo para eles
> fazerem aquilo para que lhes pagamos em vez de os soterrar em
> burocracia. Enquanto se exigem mais e mais exames, garantir que os
> miúdos aprendem com algum gosto qualquer coisa entre cada um deles.
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> Enquanto se fazem "rankings", conseguir que a escola seja um lugar de
> onde não se quer fugir. E enquanto se culpam os professores pelo
> atraso cultural do país, perder um segundo a ouvir o que eles têm para
> dizer. Agora que já os deixámos agarrados ao Xanax, acham que é
> possível gastar algumas energias a dar-lhes razões para gostarem do
> que fazem? Se não for por melhor razão, só para desanuviar o ambiente
> nos edifícios onde os nossos filhos passam uma boa parte do dia.
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